Por Otávio Celidonio*
O ano da copa do Brasil começa com uma nova promessa de safra recorde para a cultura da soja. Segunda a Conab, no campo foram semeadas 29,55 milhões de hectares, volume 6,6% maior que a área semeada na safra anterior. Com esses números o Brasil pode ultrapassar o volume de 90 milhões de toneladas, vencendo a disputa do primeiro lugar da produção mundial com os Estados Unidos.
A soja é a peça fundamental para a grande produção de carnes do Brasil, garantindo alimento de qualidade e barato na mesa dos brasileiros. E, além disso, em 2013 contribui diretamente com 31% do valor das exportações do agronegócio brasileiro, sendo decisiva para o saldo da balança comercial nacional.
Apesar dos grandes números nacionais indicarem um bom ano para a soja, a situação não parece ser a mesma quando colocamos uma lupa para observar a situação dentro da porteira, principalmente em solo mato-grossense.
Representando 29% da safra nacional, Mato Grosso é o grande destaque com área de 8,3 milhões de hectares, 5% a mais que em 2013. Porém, localizado a cerca de dois mil quilômetros dos principais portos do país e com uma logística de escoamento dos anos 70 (que nos leva a conta de transporte de mais de R$ 16 por saca de Sorriso a Santos), quando os preços da soja balança em Chicago a terra treme em Mato Grosso e a coisa pode ficar feia para o produtor.
Com cerca de 55% da soja já vendida até meados de janeiro, os preços médios do produto comercializado da safra 2013/2014 (que ainda está no campo) está em R$ 45,50 por saca, valor R$ 3,00 inferior ao preço médio de venda dos grãos colhidos na safra 2012/2013. E faltando ainda 45% da safra por comercializar, os preços do mercado não prometem trazer grandes alívios.
Com os estoques mundiais em alta os analistas projetam um ano de preços estáveis, tendendo a uma leve redução. Prova maior disto está nas projeções apontadas nos contratos futuros de Chicago para a safra 2014/2015, que se convertidas para Sorriso MT, giram próximos a R$ 40 por saca. O que ainda salva é o dólar, que segue rumo inverso e tende a aliviar um pouco as pressões de baixa da commodity.
Após três safras de ótimos resultados com margem liquida sempre acima dos 20%, ao menos no Mato Grosso, a conta está apertada. Considerando os custos completos do Imea e uma produtividade de 52 sacas por hectare, cada saca de soja deve custar em média R$ 45,20, ou seja, valor apenas R$ 0,30 abaixo do preço médio comercializado.
Ainda que alto, o custo ainda pode aumentar, já que nesta safra a possibilidade de ocorrência da difamada lagarta Helicoverpa armigera agregou ainda mais custos. Estima-se que podem ser necessárias até seis aplicações extras para combater esta praga, e os cálculos iniciais indicam que para cada uma dessas pulverizações adicionais o custo poderia aumentar em até R$ 0,50 por saca, ou seja, o impacto máximo seria de até R$ 3 por saca.
A situação só não é tão preocupante, pois cerca de R$ 10 por saca (aproximadamente 22% do custo total), vai para pagar os custos de depreciação e arrendamento. Isso significa que quem é o dono da própria terra ainda pode terminar o ano, pelo menos, com a sensação de que algum dinheiro entrou no bolso e, quem sabe, no final do ano possa existir produtores com fôlego para realizar novos investimentos para a safra 2014/2015.
No ano da copa do mundo o jogo promete ser duro para a soja mato-grossense e as contas dos produtores de Mato Grosso tendem a fechar mesmo no 0 a 0. A decisão deve ir mesmo para os pênaltis onde qualquer detalhe na venda dos grãos, formação dos custos, manejo da cultura ou mesmo no clima fará toda diferença para cada produtor.
*Otávio Celidonio é engenheiro agrônomo e superintendente do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) – otavio@imea.com.br. Este artigo foi publicado na Revista Globo Rural, ano 29, número 340, Fevereiro 2014.