Acordo costurado entre os deputados, em sessão plenária na quarta-feira (9), adiou para o próximo dia 22 a votação da Proposta de Emenda Constitucional do Trabalho Escravo. Os parlamentares falam em insegurança jurídica e argumentam ser necessário votar a proposta com definições claras do que configura a prática do trabalho escravo.
A decisão em adiar a votação agradou líderes partidários. "Vamos tentar fazer todos os acordos, sem rebaixar o tema principal. Quem comete este crime tem que ser responsabilizado", disse Jilmar Tatto, líder do Partido dos Trabalhadores na Casa.
O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Moreira Mendes (PSD-RO) disse que a bancada ruralista não é contrária à PEC, mas que quer definições mais claras sobre a matéria. "Não temos problemas com o texto da PEC, mas com a legislação infraconstitucional. A bancada ruralista é contra o trabalho escravo", defendeu.
Há quase 12 anos o mesmo assunto tramita no Congresso Nacional. O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), defendeu que a matéria precisa ser esclarecida entre os próprios parlamentares. "Ela tem que ser votada. Mas temos que fazer a separação do que é trabalho escravo e o que é o não cumprimento da legislação trabalhista", falou.
Além da caracterização sobre a prática de trabalho escravo, deputados defenderam ser necessário entender de que forma ocorreria a expropriação de terras onde for constatada a ocorrência, revertendo a área em assentamento dos colonos que já trabalhavam na respectiva área, conforme define o texto da PEC.
Criada em 1995, a lei de trabalho escravo sofreu quatro mudanças. Em novembro de 2001 o então senador Ademir Andrade (PSB/PA) apresentou a proposta de reformulação do texto. Desde então, o projeto foi apreciado em diversas sessões, mas sem nenhum encaminhamento.
A votação da PEC era esperada pela maior parte dos movimentos sociais e organizações da sociedade civil, centrais sindicais e pelo próprio governo. Juntas, as entidades mobilizaram-se e colheram mais de 53 mil assinaturas em favor da aprovação da Emenda.
Escravidão no Brasil
Casos de trabalho escravo tornaram-se frequentes nos últimos anos no Brasil. Somente entre 2003 até abril de 2012 foram 35.834 trabalhadores resgatados em situação análoga, de acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). As ocorrências geraram multas no valor de R$ 65 milhões. Somente no ano passado, 2.428 foram encontrados atuando neste regime.
De acordo com a Comissão Pastoral da Terra, o agronegócio responde pela maior parcela dos registros de trabalho escravo no país. Em 2011, 230 ocorrências foram registradas no território nacional, a maior desde 2008, que totalizou 280.
Após o resgate
Resgatado em uma propriedade de Mato Grosso, José Divino diz não ter boas lembranças do tempo em que trabalhou em condição análoga de escravidão. "Se eu tivesse trabalhado o tempo todo com a carteira assinada estaria na hora de aposentar. Prometeram para nós uma coisa, quando chegamos lá encontramos outra situação", contou o trabalhador.
Após ser resgatado e passar por cursos de qualificação, José Divino atualmente trabalha nas obras do estádio Arena do Pantanal em Cuiabá (MT), uma das sedes da Copa do Mundo de 2014.
"Essa capacidade que eles adquirem agora, essa elevação educacional e profissional faz com que não fiquem mais à mercê de qualquer proposta [de escravidão]", observou o superintendente de Trabalho e Emprego em Mato Grosso, Nivaldo Arruda.