*Por Rogério Arioli Silva Engº Agrº e Produtor Rural,
Em janeiro chove! Em janeiro chove muito! Quem conhece o estado de Mato Grosso sabe que a assertiva acima é verdadeira. Aí surge a pergunta: Mas por que então os produtores plantam soja para colher no mês de janeiro, se o mesmo se mostra tradicionalmente chuvoso? Porque são ousados deve ser a resposta mais coerente. Porque costumam teimar com muitas coisas, entre elas governos, políticas, mercados, infraestrutura e, (por que não?), com o clima.
Esta espécie de irredentismo dos produtores mato-grossenses foi herdada dos povos sulinos. É do inconformismo com as verdades absolutas que surgem as novas práticas. É da capacidade de experimentação que são forjadas as novas tecnologias desafiadoras do “status quo”. Foi deste caldeamento entre o trabalho, a ousadia e algumas pitadas de uma incipiente pesquisa que a agricultura do cerrado se desenvolveu. Esta agricultura tropical, hoje festejada pela sua pujança e competência, foi percebida pelo agrônomo americano Norman Borlaug, prêmio Nobel da Paz (1970) como “um dos mais espetaculares eventos de desenvolvimento agrícola que se realizou no mundo no último século”.
Mas parece não ser muito inteligente plantar para colher em época extremamente úmida e chuvosa. De fato pode parecer tolice, mas é graças a esta ousadia que a segunda safra vem se firmando no estado, permitindo que receitas sejam geradas e circulem na economia regional ao longo do ano todo. Quem chegou ao Mato Grosso há alguns anos atrás sequer imaginava que a realidade de duas safras no mesmo ano se consolidaria da forma como aconteceu. É positivo para todos que esta prática venha se mostrando sustentável. Melhor ainda para os fornecedores de insumos que viram seus faturamentos duplicarem, para os colaboradores que agora possuem ofertas de emprego todo ano, para os governos que aumentaram sua arrecadação e para o comércio varejista que diminuiu a sazonalidade das suas vendas.
Milho, pipoca, girassol, algodão, painço, milheto, amendoim e sorgo são opções de uma segunda safra que nem sempre é muito rentável aos produtores rurais, mas sempre o é para os outros elos da cadeia. Na verdade é importante que se diga: Os riscos climáticos desta segunda safra são inteiramente suportados pelos produtores, pois na maioria das vezes as lavouras não são financiadas e nem possuem qualquer cobertura de seguro agrícola. Como também o risco da colheita da soja na época chuvosa é um risco apenas do produtor rural. Ninguém mais estaria disposto a assumi-lo solidariamente.
Mesmo assim, planta-se para colher em janeiro. E, como já insistimos: Janeiro chove. As precauções que podem ser tomadas para realizar-se a colheita nesta época geralmente são as seguintes: aumento de capacidade de colheita das lavouras, através de colhedoras próprias ou terceirizadas; equipe de trabalho disciplinada e organizada; caminhões e secadores de grande capacidade e a dessecação das áreas. Esta dessecação apesar de aumentar a vulnerabilidade da cultura às perdas por deterioração acaba auxiliando a colheita, na medida em que facilita o trabalho das colhedoras, principalmente no que se refere à limpeza dos grãos, pois a presença de material verde (impureza) diminui.
Depois de tomadas as precauções resta a apreensão característica da época da colheita, onde é necessário que tudo corra bem, pois é muito tênue a linha entre lucro e prejuízo. Notícias deste período já são comuns: Estradas intransitáveis, caminhões atolados, filas nos armazéns, além dos tradicionais descontos abusivos de umidade, impurezas e ardidos. Esta cantilena característica das colheitas já é conhecida, e nem mesmo ela intimida aqueles que fizeram da produção rural seu modo de vida.
É graças a isso que a produção aumenta. É em consequência disto que Mato Grosso se supera a cada ano que passa. Os janeiros continuarão chuvosos, mas mesmo assim safras serão colhidas e plantadas simultaneamente, pois os produtores rurais de Mato Grosso, depois de todas as dificuldades já superadas, suprimiram a palavra medo do seu dicionário.
Rogério Arioli Silva Engº Agrº e Produtor Rural